domingo, 21 de fevereiro de 2010

A MINHA HOMENAGEM

Ainda que com outro nome, volto à blogosfera, passados quase três meses.


Desta vez a resistência foi no sentido de não escrever: houve momentos de grande pressão interior à qual, por isto e por aquilo, não me parecia oportuno ceder. Mas depois, não sei bem porquê, talvez por ter saboreado a tranquilidade do silêncio, vinha a desmobilização, a secura, a preguiça, enfim.

Retomo este cantinho, não sei ainda se para continuar – sabe-se lá o que me vai acontecer entretanto – se apenas para romper um silêncio que às vezes me provoca remorsos de consciência. Estes, bem entendido, são facilmente ultrapassáveis com considerações humanas: demasiado humanas, diria, parafraseando o filósofo louco do pangermanismo encoberto.

Mas a minha entrada hoje na blogosfera tem uma motivação e um fim muito concretos: a amizade e a justiça.

Esta última, queria referi-la, mais em tom de desabafo, a um contexto de omissões que, nem por serem pecha crónica de certos ambientes, deixam de ser injustas e, o que é pior, causadoras de inúmeros equívocos, num mundo como o nosso, onde o que se valoriza não é o que vale, mas o que brilha.

Quanta à amizade, neste caso, pelo quadro em que se criou e se foi desenvolvendo, ela serve-me sobretudo para perceber como amigo não é só aquele que sempre nos agrada, ou que nunca nos magoa: a verdadeira amizade, de facto, é algo muito diferente da harmonia no riso ou nas lágrimas, que podem bem servir de máscara a outra coisa menos recomendável.

Também não é amigo quem não sabe ultrapassar as mágoas e descobrir para além delas a boa vontade e os limites que a desvirtuam, quiçá, tantas vezes, os defeitos das qualidades das pessoas com que se lida.

Tudo isto me vem à mente quando puxo pelo calendário e vejo que passa hoje precisamente um mês sobre o falecimento do Padre Henrique.

O Padre Henrique, que era como todos o conhecíamos na intimidade, e ele gostava de ser tratado, partiu para o Pai quase sem aviso; mas não sem passar por um calvário ao qual não fazia falta nenhuma a via-sacra das irracionalidades de um certo Serviço Nacional de Saúde: foi bem um calvário sobre outro calvário.

E agora, passado um mês, contrariamente ao que acontecia enquanto ele estava entre nós, mesmo que decorresse um ano sem nos vermos, assalta-me uma saudade inesperada, que, dada a complexidade de coisas que a alimentam, se torna até estranha.

Não era fácil trabalhar com o Padre Henrique, que, além de não deixar para os outros o que lhe competia, nos ultrapassava sempre na sua entrega às tarefas comuns. E, como muitas vezes acontece a quem se movimenta na área do poder, nem sempre acertava o alvo das armas com que se defendia das manipulações.

A imagem mais antiga que tenho dele vem-me dos tempos em que, adolescente ainda, o escutava na leitura do refeitório, com aquela voz tão típica, que manteria até ao fim da vida. E nessa altura estava a uma distância quase infinita de imaginar que um dia haveríamos de estar juntos… no trabalho e nos atormentados desencontros que qualquer tarefa traz consigo, quando se lida sobretudo com pessoas.

Não quero fazer aqui a história desses anos; porque não terá muito interesse, mas sobretudo porque neste momento acho mais urgente, tendo em vista que estamos no ano sacerdotal, o grito de revolta que se ergue dentro de mim contra a ingratidão do silêncio que se abate sobre uma enorme galeria de homens que, como o Padre Henrique, se dedicaram com amor generoso e indesmentível lealdade – a Deus e à Igreja, na pessoa do seu bispo – ao serviço desta diocese.

2 comentários:

  1. Quero tb deixar aqui uma palavra de saudade do Pe. Henrique. E aguardo a eventual escrita de mais episódios a homenagearem este Padre com letra grande.

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